domingo, 26 de junho de 2011

Angústia

é um minuto que dura dez,
que dura vinte, que dura cem, que não passa.
É o céu de pixe na núvem carregada,
é a chuva fraca, é a voz embargada
gotejando uma tristeza preta, grossa, de quem não sente.
Angútia é um desespero que te corta aos poucos,
devagarinho, como agulhadas, mas constantemente.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Ser par

Todo sentimento
É um sentir medo:
Medo de falhar,
Medo de perder,
Medo de faltar,
Medo de ceder.

Medo do vazio
que, para quem sofre,
É não sentir nada.
Mas que o amor preenche melhor que ninguém,
Ao ponto de, entre uma ponta e outra do acaso,
se fazer de ponte e unir como papel colado
a vontade de ser par que todo mundo tem.

terça-feira, 3 de maio de 2011

Fila de banco

Uso a vida aos poucos. Quase não gasto, quase não durmo, trabalho mais que gasto, durmo menos que trabalho. A semana é assim, a vida é assim, a única diferença é o tamanho da fatia e os juros no fim do boleto. Mas aos domingos, ah domingos! Esses sim, merecem ser pagos à vista. Até a última moeda.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

O passado é grande demais para ser lembrado, o presente é rápido demais para ser vivido e o furuto, infinito demais para ser planejado.

sábado, 26 de março de 2011

Um fato

Aprendi que tenho dificuldade em lidar com a derrota.

E que todas as vezes que discursava "mesmo perdendo, temos que continuar com a cabeça levantada e seguir em frente" não imaginava o quanto ardia a sensação de fim. Afinal, pensando bem, é até fácil passar para a próxima luta. Mas e a que se foi? como fazer? esquecer? só erguer os olhos e sorrir? Partir para o próximo desfiladeiro sem retaguarda? Não! Tem um estandarte expondo a minha couraça de chumbo refletindo indiferença à perda, mas dentro, tenho estrutura, um emaranhado de ferro se entortando, trincando e rangendo um pedido de arrego. Um encanamento enferrujado e sujo, engasgado de tanta fumaça, que faz da sua chaminé, meus olhos, gotejando tristesa, até a hora que secar. E vai secar.

domingo, 20 de março de 2011

A semelhança entre as palavras saudade e soldado
talvez explique tantas batalhas
para esquecer certos momentos e
algumas pessoas.

Todo errado

Ando estranho,
com sensações roídas,
um grito frestando a garganta
e nos olhos, uma vontade de acontecer.
De explodir, romper a carcaça, chegar.
De suar, esquentar, ferver, estralar, sumir
e todos os infinitivos que o Houaiss me der.

Mas é só ânsia, e enquanto não sair,
fica aqui dentro, retida, essa vontade tesa,
sem ar, quase roxa de existir.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Velharia

Há palavras que escondem discursos nas mangas e até mesmo as que se demonstram superficiais, estão cheias de abismos dentre as rugas. Sim! são velhas e capciosas sendo muita vez trapaceiras, audazes. Portanto, se aprofundar na semântica é mergulhar em um penhasco codificado, traiçoeiro; da mesma maneira que cavar e ultrapassar a camada superficial da crosta terrestre ou se deixar afundar no oceano é abrir uma porta para o desconhecido.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Dulcíssimo

O olhar tempera a expressão branda. E o sorriso me faz sutil. Os gestos, serenos e calmos, não demonstram qualquer cálculo ou ensaio. Mas dentro é diferente. Tá tudo mudado, ao avesso. É ácido, triste, é quente. Se me permitirem a metáfora, digo-lhes logo de cara que, apesar da externa simpatia e a maneira doce com que as palavras saem, meu recheio está azedo e podre.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Sem parágrafo

Em linhas corridas, me faço em uma prosa sem pausa. Não quero ver os dias passarem, quero apenas que passem, como uma ou duas vírgulas, acentos e rimas fáceis de lembrar.

Esfregar para esquecer

Não posso apagar, sei. Está escrito, grafitado no muro. Mas esfrego, esfrego, esfrego na esperança de tornar mais opaco esse grito, mais surda essa dor. Se não calar, que ao menos berre só para mim, chega de ouvir o mundo ecoar esses problemas tão meus.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Pequena Humanidade

Me desculpe Pessoa, mas também tenho uma pequena Humanidade dentro de mim. E apesar da democracia reinando por enquanto, as vezes alguns brigam por revolução. As vezes brigam por tomar o poder. Qual deles ser? qual lado ceder?

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

O zunido do Mundo

Várias vozes cochichando, pés raspando, folhas abrindo, águas batendo, chorando, chovendo num gemido compassado, como uma fábrica ou uma ópera, uma ópera sem regente, cada par com sua partitura partindo para a próxima parte, para o próximo ato.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Conta dos dias

Ele conta hoje dezenove dias para uma história nova começar e refaz as contas, para fugir dos planos, do que já não pode transformar. Nas verdades que ele quer, as suas fotos são mais coloridas e na distância, se vier, a vida passa como carros que vêm e vão; o que o faz parecer uma outra pessoa, em outro lugar.

Incerta, inconstante e inconsistente.

É a felicidade, mas as vezes ela se torna tátil.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Catraca

Façamos de conta que o mundo é um metrô e as ideias são as pessoas.
Aposto que estão me evitando, quando não, trocando de vagão.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

Dado

Pobreza é fazer da grama, cama; e no calor, da sombra, cobertor. No frio, do asfalto, um jogo de quarto esperando um dia sem dor. Um dia que de fato, a submissão à pobreza moral não seja seu maior fardo ao ponto de tratar a vida como um dado, sem saber se o jogo já acabou.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Selecionar > Caixa de Spam > Ok!

Pego todos, aqueles, sabe!? iguais ao mundo e as tendências do momento e jogo na minha caixa de spam.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Quanto tempo o tempo tem?

Tento não me repartir em horas ou minutos; é impossível que a idade do tempo só seja divisível por seis e não passe de dois ponteiro e algumas pilhas. Pelo contrário, é bem mais abrangente, incalculável, relativa e diferente para cada um. Ainda lembro, por exemplo, a rapidez cortante com que a notícia de um falecimento chegou e a infinidade de subir dois andares guardando-a no peito. Como isso doía, meu Deus, e demorava.

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Às palavras órfãs.

Não é só escrever e pronto, saiu. As palavras não amadurecem sozinhas e as frases não brotam do dia para a noite, pelo contrário, precisam de cuidado e paciência na poda. As melhores, precisam de um tempo na gaveta em banho maria de tinteiro. Vez ou outra, retiro-as, acrescendo uma ou duas vírgulas, faço algumas inversões, adubo. Então, olho bem, analiso sua forma, estética, seus códigos e quando percebo que já estão crescidas e calejadas, as apresento ao mundo. Algumas voltam, cabisbaixas; outras, pelo sucesso de suas construções, nem sequer se lembram que já tiveram pai.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Faixa de pedestre

Lá em cima o boneco verde começou a brilhar, quer dizer que chegou a hora de pular nas listras brancas daquela zebra enorme, entre uma calçada e outra, que os homens insistem em ignorar.

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Letras

Não estudo por que as letras, mapas e fórmulas me atraem, todavia por ver, ainda que turvamente, um futuro melhor a cada página virada. Estudar abre soluções.

Segredinho

São Paulo, vou te contar um segredo. Tenho acordado com vontade de saborear ar puro e dormido, quando durmo, com a boca amarga.

O cabideiro

Essa roupa suja, velha e usada não serve mais. Preciso devolver 2010 para o cabide e lembrar, ainda que em alguma gaveta escondida, onde diabos guardei 2011. E tirar. E usar.

Ferrugem

Perdi a conta desses sábados que tem mais cara de segunda que a própria segunda. Não descansar corroi! E meu corpo pede brisa de domingo com cara de feriado na segunda.

Gastrite

Quando esses personagens da Globo têm essa repentina vontade de filosofar sobre liberdade, sinto minha gastrite dar sinal de vida.